Por Marcelo Aceti
Pequena crítica do filme PRO DIA NASCER FELIZ.
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Assistindo ao filme, resolvi buscar algumas informações na página eletrônica que hospeda suas informações e confirmei algumas suspeitas. Longe de dizer que o documentário é um mau trabalho; ele simplesmente, sob meu ponto de vista, não é satisfatório no que diz respeito a sua proposta - apresentada na sinopse. Primeiro que não há meio de registrar o ambiente escolar "sem exercer interferência direta", ainda mais quando uma câmera passeia livremente pelos corredores, interrompe aulas, e uma equipe direciona as falas dos entrevistados, faz perguntas e conduz para que tudo flua 'bem'. Segundo - e, para mim, mais importante - é que, ainda que o diretor diga: "Eu não acredito muito em roteiro para documentário. Eu acredito em um roteiro de idéias.", o filme é conduzido, sim, por um roteiro que joga com estereótipos para transmitir uma mensagem.
Fugir do estereótipo dos estudantes de escolas públicas, apresentando a vida e a obra de Valéria, a poetisa sertaneja de 16 anos eo carioca de Duque de Caxias Deivison Douglas, salvo pelos tambores da música afro, e, depois, firmar o estereótipo de alienadas, egocêntricas e desumanas filhinhas-de-papai do bairro rico da capital, que pensam em todos como iguais - filosoficamente - e que até gostariam de contribuir para um mundo mais justo, não fosse o fato de, para isso, terem de abrir mão de suas aulas de natação; tudo isso é um roteiro maquiavélico que comove e leva à reflexão de alguns pontos. Pontos que, para mim, não são os mais importantes.
Após a divulgação do documentário, a escola de Manari recebeu verbas para reformas e passou a oferecer, também, o Curso Normal. A escola reformada aparece ao fim da filmagem e alguns depoimentos mostram que, apesar de a reforma ter sido feita, há poucos professores e a estrutura de manutenção não funciona. Ou seja, foi feito o que 'aparece' a curto prazo, para que o documentário não fizesse uma denúncia grave que não fosse respondida, mas o problema apenas trocou de lugar. Vendo o que esta reforma expõe, penso: Será que devemos fazer documentários com todas as escolas, para que sejam reformadas?
A cena do conselho de classe revela mais do que uma triste realidade; mostra que a educação sofre de algo mais que problemas crônicos: é uma deficiência institucional. Ao questionar sobre a possível aprovação de um aluno, que o levaria para o Ensino Médio, uma das professoras - Vera Lúcia - é contra, alegando: "(...) ele vai ser um problema no 1º ano. Ele vai ser; ele não sabe escrever." O problema não é o aluno, mas sim a escola que faz com que ele seja aprovado anos e anos sem desenvolver capacidades básicas, necessárias a todas as disciplinas. A declaração da professora Suzana resume a problemática e levanta uma questão importante, complexa e que muitos - quase todos - preferem evitar, que é a necessidade de revermos o paradigma da escola: "Eu não acredito na escola nos moldes em que ela existe, sabe?! na função que ela tem. Eu acho que ela tinha que ser repensada(...) Ela não cumpre mais a sua função."
Bem ou mal, as pessoas deixam escapar certas coisas nos depoimentos. A pose de mártir dos professores ali presentes só maquia o quanto os próprios são despreparados. O piti daquela professora da escola de Duque de Caxias mostra isso. A mulher não vai ser nunca respeitada berrando para os alunos que não está ali para "aturá-los". Penso que a postura de um professor hoje deve ser semelhante, em certos momentos, à frieza de um médico ao cortar um corpo com a finalidade de curá-lo. Numa realidade carente como aquela, o professor não pode simplesmente esperar que o aluno se comporte como exemplar só porque ele, professor, fez a faculdade para estar ali - faculdade esta que nós sabemos bem, ridícula de se entrar de tão medíocre que é a exigência no vestibular e pequena a concorrência. Por outro lado, existe sim o lado humano que não deve ser ignorado, mas aparecer na hora certa. Agora, quando se olha o lado das filhinhas de papai, chega a ser cômico. O depoimento da garota dizendo que "será que eu estou 'menos mulher'?" reduz a capacidade que uma pessoa tem para gastar o seu dinheiro sabiamente, a zero. Um detalhe que me chamou a atenção - dentre tantos - foi o livro que estavam trabalhando em sala: "O cortiço". Tudo a ver com o teor do filme, determinista. Se você nasce com o dinheiro, num ambiente de riquezas, você vive numa "bolha" (e como a loirinha lá falou, a bolha pode ser transparente e você pode ver o menino PEDINDO bala); mas, caso você seja da favela, o meio te faz um "Acerola", "Laranjinha" e, se você tiver veia pra bandidagem mesmo, um "Zé Pequeno". Às vezes, você pode ser salvo pela escola, sendo aprovado e entrando pra banda de Afro-Reagge. Você vai viver a vida na boa, às vezes pegando em arma, às vezes fumando um e furando uma gostosa, e no final das contas, vai pro exército realizar o seu sonho de ascenção. Se não ascender, pelo menos volta do exército bem treinado pra trabalhar no tráfico.
ResponderExcluirOs créditos finais são uma piada também. Você faz umas 10 entrevistas e no fim só conta os finais felizes. Inclusive da patricinha que nada e faz ioga que conseguiu a sua vaga na USP e todo dia vai pra lá, feliz, rolando em sua bolha.